segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Idéias

O Espiritismo na Cultura Popular III

Lembra do último artigo, quando prometemos tratar dos significados de um dogma cientificamente impossível, mas facilmente assimilado pela cultura popular? Eis que abordamos agora a famosa Virgindade de Maria. Não queremos defender a veracidade do fenômeno, mas sim captar o que os ecos desse discurso têm a nos oferecer.

O primeiro fato que devemos tomar consciência é que para os judeus a virgindade perpétua era motivo de escândalo, motivo de desprezo. A mulher, no pensamento agrário e totalizador desse povo, tinha de ser como uma boa terra: fértil. Ora, a descendência de Abraão deveria povoar o mundo.

Não era um valor de virtude de autocontrole a manutenção da virgindade, como o era para os estóicos. Tão pouco era um relacionamento sacro-carnal entre as virgens da terra e os deuses do céu, algo como as vestais. A virgindade era um valor a ser ultrapassado por um ritual bem específico daquela sociedade. A infertilidade era mal vista. Vide o pesar de Sara por não gerar filhos ao pai Abraão, vide a reclusão que era imposta a mulher em seu período menstrual nessa cultura por ser este um período infértil.

A virgindade de Maria, portanto, antes de ter representado um repúdio ao sexo, representou uma condição humilhante de Maria. Jesus nasceu pobre e de uma mulher virgem.

Mas, a virgindade dela não tinha um valor em si. Era uma virgindade a serviço constante de Deus. Uma condição humilhante a serviço de Deus, bem conforme um discurso de resignação. Sendo que, do seio da humilhação, Deus trazia o salvador daquele mundo. Não tirou o messias de uma seita privilegiada, mas dos maltratados da terra.

O segundo fato é o caráter surpreendente que representa a virgindade. Esperava-se que o messias viesse de um casal que tivesse passado pelos ritos sociais. Maria é surpreendida grávida sem nunca ter conhecido varão. Nesse ponto o discurso da virgindade nos fala das manifestações de Deus na vida humana, inesperadas e, porque não dizer, ilegais.

O mais duro obstáculo que encontramos na ciência oficial é a sua impossibilidade de reconhecer o que não pode conceber na sua perspectiva de laboratório, quando Deus se manifesta além de todo condicionamento experimental. A vida pulsa de surpresas.

Um terceiro fato: o louvor à onipotência. Se de uma virgem é impossível nascer criança, derruba Deus as concepções humanas e lança sombra sobre o ventre de Maria, fazendo ser o que não se acreditava que pudesse vir a ser.

Por último, nessa mensagem milenar da virgindade, dorme a mais sublime mensagem de mediunidade. A mediunidade é assim como a virgindade de Maria. Eurípedes Barsanulfo, conhecido vulto do espiritismo, grande médium e divulgador da doutrina no interior de Minas Gerais, se admirou quando viu um sertanejo pobre, virgem(!) de qualquer conhecimento, proferir uma palestra com as mais belas reflexões sobre a doutrina espírita – falava mediunicamente!

Contrariando aqueles que acreditam e lutam por uma sociedade construída apenas pelo esforço humano, o discurso da virgindade vem trazendo uma verdade que há coisas no mundo que vieram direta e gratuitamente de Deus. O amor incondicional, a misericórdia, a piedade, são todos eles palavras do caderno divino que nos dá esse tom virginal.

Mas, afinal de contas, por que falar de Maria num blog sobre arte espírita? Faz parte de nossa promessa de pensar sobre o que poderia ser uma arte espírita nordestina. Faz parte de tentar compreender esse movimento tão singular que é o Espiritismo Brasileiro, com cores tão nossas.

Antes de sermos uma corrupção do que era a nobreza espírita francesa, talvez tenhamos um outro discurso que enriqueça ainda mais o espiritismo pro mundo. Falaremos disso!

Allan Denizard

Um comentário:

MAURO BARBIERI disse...

Muito obrigado por visitar e acompanhar o blog espiritismo nas hqs, espero que os bons espiritos continuem me inspirando para que tenhamos um bom material para a divulgação!
abs!